Ecolocalização em Morcegos

Histórico

Spallanzani colocou cera nas orelhas e verificou que a navegação era comprometida. Ao remover a visão a navegação não era tão comprometida.

Hartridge colocou-os em um ambiente totalmente escuro e replicou os resultados de Spallanzani cunhou o termo visão sonora.

Galambos, Griffin e Pierce verificaram que morcegos emitem ultrassom e que eles necessitavam da boca e orelha para uma boa navegação.

Ecolocalização

In principle, this is very simple – send out a sound wave (‘ping’) into the environment, and then use the information encoded in the returning echo to locate objects of interest. Because the listener is also the noise‐maker, it knows exactly what type of noise to listen for, and can develop specialised mechanisms to separate out that noise from background interference

Sillar - The Biosonar System of Bats

Em resumo:

  • É utilizada tanto para navegação quanto para detecção de presas
  • O Som é refletido por objetos no foco
  • Análise do eco
  • Quanto maior a frequência, menor é o tamanho necessário do alvo
  • Morcegos tem que produzir soms com intensidade muito grande, pois ela
    • Cai com o quadrado da distância (tanto na emissão quanto na reflexão)
    • Cai por absorção

Fases do Ataque

O ataque pode ser dividido em três fases: procura, aproximação e terminal buzz. Sendo a aceleração do ritmo dos pulsos a marca das passagens de fase.

  • Procura: pulsos emitidos com baixa frequência, grande duração e direções variadas
  • Aproximação: pulsos emitidos com maior frequência, menor duração e direção focada
  • Terminal Buzz: aumenta a frequência de emissão dos pulsos e diminui a duração dos pulsos

Exemplo:

Produção do Som

O som emitido é composto por uma frequência fundamental e uma, ou mais, harmônicos. Em geral os hamônicos dos morcegos contém mais energia do que a fundamental.

Ele é emitido pelo nariz ou pela boca. Algumas espécies, dado a geometria do emissor, conseguem cancelar o som lateral através de interferência, de modo que o som é focado em uma direção.

É necessário gerar o som ao mesmo tempo que persegue a presa. Desse modo os pulmões tem duas funções. Isso é eficiente quando está perseguindo, pois a respiração rápida e forte necessária para o voo permite a produção de som durante a expiração. Entretanto quando está empoleirado o custo de produção é quase tão alto quanto o de voar.

  • Cada pulso tem certa duração
  • Existe um delay entre um pulso e o echo
  • Um ciclo é o tempo entre dois pulsos
  • Duty cycle é a proporção de tempo entre a duração do pulso e a duração do ciclo

Tipos de Som

Existem duas classes de sinais de ecolocalização: Frequência Modulada (FM) e Frequência Constante (CF).

Frequência Modulada

Série de pulsos muito curtos (5ms ou menos) que contém uma queda na frequência, em geral de 60kHz até 20kHz.

Se o pulso e o eco se sobrepõe há dificuldade de separar o sinal da resposta. Com isso, os morcegos FM tem um duty cycle pequeno, desse modo nunca há sobreposição entre a emissão e o eco.

São melhores para computar a distância da presa.

Frequência Constante

Pulsos longos de frequência constante. Poucos, ou nenhum, morcegos emitem CF puras, geralmente elas iniciam e/ou terminam com um componente FM.

Os morcegos CF tem alto duty cycle, ou seja, a emissão é longa e ocupa grande parte do ciclo. Desse modo quando a distância diminui o eco pode sobrepor a emissão. O problema da sobreposição é mitigado pelo efeito Doppler, pois o morcego consegue ignorar a frequência emitida e escutar a frequência alterada pelo efeito Doppler.

São melhores para computar a velocidade relativa. Também são úteis para detectar presas em distâncias maiores e identificar a presa.

Recepção do Som

Orelhas

Os morcegos tem as orelhas externas grandes, capturando o máximo de som possível. Elas também são móveis e possuem estruturas horizontais que agem como lentes de Fresnel, ambos os fatores ajudam na direcionalidade e a focar o som no tragus, que por sua vez reflete o som para o canal auditivo.

Membrana Coclear

Em morcegos CF a vibração da membrana coclear não varia uniformemente ao longo do seu comprimento, como ocerre na maioria dos mamíferos. Ela possui a região da frequência um pouco mais alta do que o harmônico mais energético (geralmente o segundo) expandida. Isso quer dizer que eles tem mais neurônios aferentes sensíveis à essas frequências.

Essa região é chamada de fóvea acustíca.

Distância

A distância $d$ é dada pelo intervalo de tempo $\Delta T$ entre a emissão e o retorno do eco. Como a velocidade do som é constante no ar, temos que:

$$ d=\frac{v_{som}\Delta T}{2} $$

O componente CF não é preciso para obter informações temporais. Pois os mesmos sensores de frequência são ativados por toda duração do sinal.

Essa informação precisa é obtida pelo componente FM. Os neurônios sensores de frequência são ativados por pequenos instantes, ou seja, eles têm precisão temporal. Como o pulso FM passa por um intervalo de frequência, os diversos neurônios precisos obtem precisão temporal, conferindo acurácia à medida.

Posição

A posição é obtida pelos mesmos mecanismos que outros mamíferos:

  • Diferenças binaurais em tempo e intensidade para determinar o azimute
  • Comparar espectro de frequência com passado

Velocidade Relativa

O componente CF é responsável por determinar a velocidade relativa pois ele possibilita explorar o Efeito Doppler. Considere que o morcego emite o pulso com frequência $f_{pulso}$, a frequência do eco recebido $f_{eco}$ pode ser:

  • $f_{eco}>f_{pulso}$ o morcego está mais rápido que a presa
  • $f_{eco}=f_{pulso}$ o morcego e a presa estão com a mesma velocidade
  • $f_{eco}<f_{pulso}$ a presa está mais rápida

A velocidade relativa pode ser calculada por: $$ v=\frac{c(f_{eco}-f_{pulso})}{2f_{pulso}} $$

Compensando o Efeito Doppler

Dado que o morcego tem a fóvea acústica mais sensível à frequências específicas, o efeito Doppler pode tirar o eco dessa região. Porém os morcegos alteram a frequência do pulso de maneira que o eco cai na região preferível. O ajuste ocorre entre, e não intra, os pulsos, como um feedback negativo.

Na imagem podemos ver o Doppler Shift Compensation (DSC) em ação. Note que quando o alvo está se distanciando não há motivo para fazer o DSC

Identificando a Presa

O bater de asas das presas causa pequenas diferenças no efeito Doppler e na amplitude do eco.

Em cada ciclo do bater de asas da presa, a asa passa por um estado mais próximo e um estado mais afastado do morcego, isso causa efeito Doppler na frequência do bater de asas.

O bater de asas também expõe uma quatidade diferente de área que reflete o pulso, logo também há uma modulação na amplitude.

No Cérebro

O córtex auditório dos morcegos contém pelo menos três mapas neurais descritos na tabela a seguir.

Área Sinal Parâmetro Função
FM-FM Pulso e eco Delay temporal Distância e tamanho
CF-CF Pulso e eco Frequência Velocidade relativa
DSCF Eco Frequência e amplitude Bater de asas

FM-FM

Os sinais FM possibilitam acurácia e precisão temporal, logo são úteis para determinar o delay entre o pulso e o eco, e, consequentemente, a distância da presa.

Os neurônios dessa região respondem à um par de sons com um intervalo pequeno e específico entre eles, ou seja, eles são combination-sensitive neurons. Eles ativam com o eco, de modo que cada neurônio é sensível a um determinado intervalo de tempo.

O primeiro som, pulso, deve estar na frequência fundamental $H_1$, enquanto o segundo som deve estar em um dos harmônicos mais altos ($H_2$, $H_3$ ou $H_4$). É interessante notar que o morcego emite o $H_1$ mais fraco, de modo que apenas ele consegue ouvir. Com isso esse mecanismo é específico ao seu próprio pulso.

A região FM-FM está dividida em três no eixo dorsal-ventral. A mais dorsal contém os neurônios que respondem aos pares $H_1-H_2$, a do meio $H_1-H_4$ e a ventral $H_1-H_3$.

O eixo caudal-rostral codifica o tamanho do intervalo, de modo que neurônios sensíveis a delay mais longos ficam localizados mais cauldalmente.

Além do delay os neurônios são sensíveis à amplitude do eco. Como a amplitude é afetada pelo tamanho do objeto que refletiu o pulso (quanto maior o objeto, maior a amplitude) o morcego consegue informação do tamanho da presa.

CF-CF

Os neurônios da área CF-CF também são combination-sensitive. Eles respondem à combinação da frequência fundamental emitida e um harmônico mais alto no eco. A região dorsal ($CF_1-CF_2$) é responsável pela fundamental e segundo harmônico e a ventral ($CF_1-CF_2$) pela fundamental e o terceiro harmônico.

A velocidade está codificada num mapa tonotópico (mapa de frequência) em duas dimensões. O eixo rostro-caudal tem um mapa de banda curta em sensível à $H_1$. O eixo dorsal-ventral também tem um mapa de banda curta, mas sensível à $H_2$/$H_3$. Isso quer dizer que a atividade de qualquer neurônio no mapa indica uma combinação de todas as frequências.

O mapa tonotópico é um mapa implícito de velocidade. A atividade rostral representa que o morcego tem uma velocidade relativa positiva ($9ms^{-1}$ no extremo), já a atividade caudal uma velocidade relativa negativa ($-2ms^{-1}$) no extremo).

Doppler-Shifted Constant Frequency (DSCF)

A área ventral à CF-CF também contém um mapa tonotópico, sendo que os neurônios caudais respondem à baixa frequência e os rostrais à alta. Essa área é homóloga ao A1 de outros mamíferos.

Nos morcegos a região central é expandida e responsável por analisar o DSCF. Os neurônios do DSCF são ativados por bandas muito pequenas centradas no segundo harmônico do eco compensado do efeito Doppler. Eles também formam um mapa mas estão organizados radialmente.

Os neurônios também constituem um mapa de amplitude, os ventrais respondendo à baixas amplitudes e os dorsais a altas.

Parte da razão é que os ventrais integram a entrada de ambas as orelhas, i.e. são neurônios do tipo E-E. Eles são especializados para detecção.

Já os dorsais são excitados por sons contralaterais, mas inibidos por sons ipsilateral, i.e. são neurônios do tipo I-E. Eles são especializados para direcionalidade.

Por essas características a área DSCF é ideal para detectar pequenas mudanças na frequência, possibilitando a compensação do efeito Doppler. Somando isso às pequenas mudanças na amplitude, a área possibilita detecção do bater de asas da presa.

Simulação

Abaixo temos uma simulação do DSCF. Ela foi construída em JavaScript utilizando as bibliotecas p5js e function-plot para visualização.

O objetivo da simulação é principalmente didático, logo optamos por uma focar nos aspectos visuais e interativos. Dessa maneira o usuário final pode fazer seus próprios experimentos ao variar os parâmetros e observar o resultado.

Questões

A atividade dessa semana é diferente: fazer uma animação que explique a atividade de uma área do córtex auditivo do morcego

  • Grupos 01, 04, 07, 10, 13, 16, 19, 22, 25, 28: Área FM/FM
  • Grupos 02, 05, 08, 11, 14, 17, 20, 23, 26, 29: Área CF/CF
  • Grupos 03, 06, 09, 12, 15, 18, 21, 24, 27, 30: Área A1/DSCF

Pode usar o recurso que quiser:

  • Neuron: Audaz
  • Simbrain: Corajoso
  • Neuronify: Caprichoso
  • Powerpoint: pragmático
  • A ferramenta da sua escolha (e informe qual foi!)

Resumo Reflexivo

O tema da aula de hoje foi extremamente interessante! Novamente mostra o quão interdisciplinar essa displina é. A tarefa da semana também me pareceu ser uma ideia muito boa, embora acredito que seria necessário mais tempo para modelar e fazer simulações.